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Homens (e mulheres) de preto

02 de março de 2012

NELSON MOTTA - O Estado de S.Paulo


Como um capitão Nascimento da magistratura, a ministra Eliane Calmon está combatendo os bandidos de toga, os traficantes de sentenças e os vagabundos infiltrados no Judiciário, em defesa da imensa maioria de juízes honestos e competentes que honram a instituição. Por isso é alvo do tiroteio corporativo que tenta fazer de acusações a maus juízes suspeitas sobre toda a classe.
Para merecer os privilégios de que desfrutam, maior rigor é exigido dos que julgam. Nesta nobre função não basta ser honesto, é preciso parecer honesto, ter a integridade, a independência e a competência exigidas pela magistratura, para que a Justiça seja respeitada, e temida, porque sem ela não há democracia.
"Não tenho medo dos maus juízes, mas do silêncio dos bons juízes, que se calam quando tem que julgar colegas", fuzilou a faxineira-chefe. E quem há de contestá-la? Todo mundo entende as relações de amizade que se estabelecem ao longo de muitos anos de trabalho, mas quem escolhe esta carreira - ao contrário de engenheiros, médicos, advogados ou músicos - tem de estar preparado para julgar igualmente a todos, do batedor de carteiras ao presidente da República - e aos seus colegas.
Com razão, ela diz que os juízes de segundo grau, quando enveredam para o mal, são os mais deletérios, porque os de primeira instância, por corrupção ou incompetência, podem ter suas sentenças anuladas pelo colegiado do tribunal superior. Mas é quase impossível um desembargador ser condenado pelos seus pares.
A ministra os conhece bem: "Esses malandros são extremamente simpáticos, não querem se indispor, dizem que o coração não está bom, que estão no fim da vida". Alguém imagina os desembargadores do Tribunal de Justiça, digamos, do Maranhão, condenando à pena máxima - aposentadoria remunerada - algum colega agatunado? Quanta pressão um juiz pode suportar do político que o nomeou?
Por tudo isto a corregedora nacional apoia a emenda constitucional do senador Demóstenes Torres (DEM-GO) para que os desembargadores sejam julgados com isenção, não por seus colegas de tribunal, mas pelos juízes do Conselho Nacional de Justiça.



Sem convencer


MERVAL PEREIRA - O GLOBO - 29/06/11
O ministro da Ciência e Tecnologia, Aloizio Mercadante, não deixou muitas saudades entre seus colegas no Senado com sua maneira arrogante de agir e suas vacilações políticas. Recentemente, em uma solenidade em Brasília, teve um desentendimento com o senador Antonio Carlos Valadares, do PSB de Sergipe, exigindo que lhe cedesse sua cadeira por se tratar de um ministro de Estado. Valadares não cedeu, e comentou depois que faltavam votos para o petista impor sua vontade.

Derrotado pela segunda vez para o governo de São Paulo, Mercadante ganhou de consolação o Ministério da Ciência e Tecnologia, que era um feudo político do PSB, e agora está às voltas com as críticas de um importante aliado do Planalto.

Ontem, no depoimento da Comissão de Assuntos Econômicos do Senado, onde tentou negar sua participação no episódio do dossiê dos aloprados contra José Serra na eleição de 2006, Mercadante se viu novamente diante de críticas do senador Francisco Dornelles, do PP do Rio.

Ele fez questão de avisar a Mercadante que não apoiaria um pedido de investigação a seu respeito, diferentemente do que fizera Mercadante quando José Sarney e Renan Calheiros, aliados do PMDB, estiveram sob fogo cruzado da oposição e o petista, líder do governo no Senado, piscou.

Na votação para salvar Renan Calheiros da cassação no plenário do Senado, ele se absteve e deu o sinal para que sua bancada seguisse o caminho que aparentemente era o mais fácil para cumprir as determinações do Planalto e não sujar as mãos publicamente.

Não ganhou o reconhecimento de Renan Calheiros, e perdeu credibilidade diante dos seus eleitores.

De outra vez, quando tentou uma manobra mais coerente com seu discurso e anunciou sua renúncia "irrevogável" em protesto contra a defesa do senador José Sarney pelo governo, a direção nacional de seu partido passou por cima dele como um trator, desautorizando-o publicamente, seguindo orientação pessoal do então presidente Lula.

Diante da reação pessoal de Lula, e depois de uma conversa de 5 horas com o então presidente, Mercadante deu o dito por não dito e revogou a irrevogabilidade de seu ato.

A versão de Mercadante, de que fora uma conversa "amiga e franca, relembrando momentos históricos dos últimos 30 anos", segundo versão mais crua vazada por fontes do próprio partido fora, na verdade, um "puxão de orelhas" do presidente Lula em seu pupilo, a quem teria dito: "Não dá para vacilar diante do primeiro embate. As alianças têm duas mãos".

O episódio dos aloprados na eleição de 2006, em que um grupo de petistas comprou dossiês contra José Serra, então seu adversário ao governo de São Paulo, e Geraldo Alckmin, candidato tucano à Presidência, já marcara sua vida política, pois seu principal assessor era o comandante da operação ilegal que ele alega até hoje ter sido montada à revelia.

Pois, como disse o senador Dornelles, "nada como um dia depois do outro". Mercadante, segundo revelação do burocrata petista Expedito Veloso, foi um dos líderes dos aloprados.

Quem se der ao trabalho de ouvir a gravação da conversa de Expedito com amigos petistas no site da revista "Veja", que divulgou a informação, verá que não há dúvida de que toda a operação partiu da necessidade de Mercadante de criar um fato político que levasse a disputa com Serra para o segundo turno, ocasião em que Orestes Quércia, que também financiou o dossiê, o apoiaria em troca de "um naco" do governo.

Expedito Veloso, hoje um assessor graduado do governo petista de Brasília, é didático na sua conversa gravada, e culpa Mercadante pelo fracasso da operação.

Segundo ele, se Mercadante não tivesse mentido dizendo que o dinheiro já estava todo arrecadado, Valdebran Padilha, um dos aloprados que foi a São Paulo juntamente com Hamilton Lacerda para comprar o dossiê, não teria sido preso.

Os aloprados, no entanto, tiveram que ficar quatro dias em São Paulo, e não duas horas como previsto, esperando que o dinheiro chegasse, e essa movimentação teria chamado a atenção da Polícia Federal.

Embora Mercadante afirme que a participação de Lacerda, seu braço direito na campanha, acontecera à sua revelia, Expedito, na conversa gravada, explica o raciocínio político por trás da compra do dossiê, ficando claro que a manobra correspondia a uma estratégia petista para beneficiar Mercadante.

Tanto é verdade que, na gravação, Expedito revela um "trabalho" anterior dos aloprados petistas, a divulgação de dossiês contra a ex-senadora petista Serys Slhessarenko e o tucano Antero Paes de Barros pelo ex-deputado federal Carlos Abicalil, hoje secretário de Educação Especial do MEC, cujo sucesso os levou a arquitetar o plano contra Serra.

E explica a ligação: "O Valdebran (Padilha) foi coordenador financeiro do Abicalil".

O petista já tentara desqualificar a gravação obtida pela "Veja", alegando que Expedito emitira nota negando tudo.

O que Expedito diz na nota é que nunca revelou nenhum nome em seus depoimentos, o que pode ser verdade. Ele só citou Mercadante e os demais envolvidos na tramoia em conversas informais, que foram gravadas e cujo conteúdo ele confirmou ser verdadeiro.

Outra revelação, a de que a atual ministra das Relações Institucionais Ideli Salvatti, então líder do PT no Senado, participou de reuniões sobre o dossiê e ajudou a divulgá-lo extraoficialmente para alguns jornais, é desmentida pela metade.

Ideli admite que participou de reuniões no gabinete de Mercadante, com a presença de diversos dos aloprados, mas alega que o assunto era outro.

Com o governo dominando tão amplamente a Câmara e o Senado, dificilmente o assunto vai render. Resta a reabertura do processo pelo Ministério Público ou pela Polícia Federal, diante das novas evidências.





Sangria desatada

Dora Kramer - O Estado de S.Paulo


Com maioria cuja fortaleza é celebrada de norte a sul, de leste a oeste, espanta que o governo precise recorrer a estratagemas típicos de oposição para evitar uma derrota em plenário, como fizeram os líderes governistas na Câmara dias atrás ao obstruir a sessão e derrubar o quórum para a votação do novo Código Florestal.

É igualmente espantoso que, com toda sua capacidade de aniquilar a oposição que fez a história do mito Lula, o PT no poder necessite recorrer a expedientes exorbitantes para impedir que requerimentos de convocação do ministro Antonio Palocci sejam postos em votação, correndo a trancafiar salas para evitar reuniões de comissões na Câmara e mandando o guarda da esquina atrás de deputados a arrancar cartazes das paredes da Casa.
Assim como é intrigante que toda lisura existente no processo de enriquecimento do ministro da Casa Civil nos últimos quatro anos em que esteve deputado federal necessite da contratação de serviços de emergência em comunicação e mobilização do governo inteiro numa operação dita de contra-ataque.
Ou essa maioria não é aquilo tudo o que se diz ou o crescimento do patrimônio de Antonio Palocci não está tão acima de qualquer suspeita como alegam seus defensores, que há dias tentam dar o caso por encerrado a golpes de gestos truculentos e de retórica falaciosa.
Quando a semana começou, havia uma reportagem da Folha de S. Paulo mostrando que Palocci acumulara, entre 2006 e 2010, bens imóveis no valor de R$ 7,5 milhões e havia também uma expectativa de que o ministro conseguisse comprovar a licitude do patrimônio.
A semana termina sem a devida explicação e com muito mais: o governo movendo mundos e fundos para evitar que o ministro se explique, notícias sobre faturamento de R$ 20 milhões na consultoria do ministro só no ano eleitoral de 2010 e uma empreiteira com contratos no setor público dizendo-se cliente de Palocci.
À lista acrescente-se a suspeita do uso da votação do Código Florestal como moeda de troca com a tropa de defesa no Congresso, a proposta de criação de uma CPI e uma grande quantidade de requerimentos de convocação a serem apresentados na Câmara e do Senado.
No campo político, a contraofensiva governista obedece ao velho roteiro de criar uma realidade paralela em que transitam conspiradores interessados em desestabilizar a República e opositores empenhados em promover um "terceiro turno" das eleições.
Logo entrará em cena o espetáculo "nós contra eles", com forte inclinação a criminalizar o noticiário.
Um forrobodó digno de grave crise, onde não há nada de grave a não ser o fato de a evolução patrimonial do ministro continuar sem explicação.
A reação defensiva do governo é desproporcional às manifestações de confiança na lisura de Palocci.
Por que impedi-lo de falar ao Congresso? Quando ministro da Fazenda, acusado de frequentar uma casa de lobby em Brasília, Antonio Palocci tomou a iniciativa de se explicar.
É bem verdade que na ocasião mentiu, como se viu adiante pelo depoimento do caseiro da referida residência, Francenildo Costa, testemunha da presença constante de Palocci no local.
A propósito, Francenildo, quando suspeito de receber um dinheiro "atípico", no mesmo dia exibiu o extrato da conta com o depósito feito... pelo pai. Lançada no ar na tarde de uma sexta-feira, no sábado a acusação já não viu a luz do dia.
Desse modo simples é que se enterram suspeitas.
Uma no cravo. A emenda da senadora Marta Suplicy ao projeto de criminalização da homofobia, criando uma exceção para "manifestação pacífica de pensamento decorrente de ato de fé", tem o evidente objetivo de conquistar o apoio das bancadas evangélicas.
Diante das reações contrárias, a senadora já admite retirar a emenda. O que, de um lado, pode satisfazer às ponderações (justas) de que a exceção é uma brecha à aceitação da intolerância, de outro reacenderá a rejeição dos evangélicos capitaneados no Senado por Marcelo Crivella e na Câmara por Anthony Garotinho.
Ambos da base do governo.




Sistema de lista fechada viola voto direto e secreto


Por Lizete Andreis Sebben - Consultor Jurídico - 28/04/11

A adoção do voto proporcional em listas fechadas, ou seja, para deputados federais, estaduais, distritais e vereadores foi aprovada pela Comissão de Reforma Política do Senado, dentre diversos outros pontos polêmicos, alterando totalmente o atual sistema. Assim, por exemplo, se determinado partido político obtiver votos para eleger dez deputados em um estado, os dez primeiros da lista serão eleitos. Anteriormente, somente eram eleitos os mais votados.

Com essa proposição, extingue-se a denominada lista aberta, onde o eleitor escolhe seu candidato e vota diretamente nele. O voto será dirigido para partidos políticos, vale dizer, voto de legenda. No sistema sugerido, cada agremiação partidária apresentará uma lista de candidatos pré-selecionados e, conforme os votos recebidos pelo partido, serão considerados eleitos aqueles dela constante, na ordem em que se apresentarem.

A indagação que se impõe é como serão elaboradas essas listas e se, de fato, as pré-escolhas respeitarão a necessária igualdade dos candidatos no pleito. Persistirá, ainda, a necessária renovação dos eleitos ou haverá fortalecimento daqueles que estão no comando da agremiação partidária, que controlam, coordenam e norteiam os partidos políticos, perpetuando as oligarquias?

O atual presidente do Tribunal Superior Eleitoral, ministro Ricardo Lewandowski, além de apontar os problemas em relação ao atual sistema de eleições proporcionais, relativamente à lista fechada, referiu o risco da proposição atrapalhar os partidos menores, defendendo a necessária participação da militância na elaboração dessas listas.

Evidentemente que polêmico, o tema ainda passará por inúmeras defesas e ataques. Antes de ser encaminhado ao plenário para aprovação e posteriormente enviado à Câmara dos Deputados, cumpre a Comissão de Constituição e Justiça a análise da proposição sob o crivo da constitucionalidade.

Nesse particular, ressalte-se que a Constituição Federal, no artigo 14, que trata dos direitos políticos, estabelece, de forma clara, que a soberania nacional é exercida pelo sufrágio universal pelo voto direto e secreto, com igual valor para todos, o que induz a inconstitucionalidade da proposição.

Antecipadamente, antes mesmo de aprovada a proposição pelo Congresso Nacional, já se observa que a mesma será amplamente jurisdicionalizada, cuja decisão final cumprirá ao Supremo Tribunal Federal, órgão do Poder Judiciário responsável pela guarda da Constituição Federal.



Visões distintas - Dora Kramer - O Estado de S.Paulo
A condução do debate sobre a reforma política vem sendo feita concomitantemente na Câmara e do Senado, embora deputados e senadores adotem métodos distintos de trabalho.
Estes optaram pela rapidez de uma proposta elaborada em 45 dias por uma comissão e aqueles preferiram a solidez de um projeto construído mediante a realização de seminários País afora e audiências públicas com figuras de destaque na política.
Em princípio, o caminho mais longo escolhido pela Câmara parece ser o mais acertado e com maior chance de êxito no que tange ao essencial: a inclusão dos interesses do público e a ampliação da discussão para além das conveniências dos partidos.
É cedo, contudo, para se afirmar que o roteiro dos deputados levará necessariamente ao resultado acima presumido, porque nem sempre o esboço de boas intenções se converte ao final nas melhores ações.
O Senado até agora se comportou nesse assunto como um clube de excelências interessadas em lustrar a própria imagem. Os senadores escolheram um elenco de propostas que eles mesmos avaliam que não têm chance de prosperar por causa da ausência do consenso mínimo necessário em torno de qualquer uma delas para se aprovar alterações na Constituição.
Na Câmara, por enquanto, os deputados fizeram algumas discussões internas, audiências públicas com entidades civis e, a partir desta semana, promovem seminários em todas as regiões do País a fim de recolher sugestões.
Uma boa ideia. Assim como o convite para que dois ex-presidentes da República, Fernando Henrique e Lula, os dois únicos sem mandato parlamentar, sejam ouvidos a respeito. As respectivas assessorias já informaram que ambos se prontificaram a comparecer e dizer o que pensam sobre as mudanças necessárias.
Há quem enxergue na lentidão da Câmara o risco de as novas regras não serem aprovadas a tempo de entrarem em vigor para as eleições de 2012.
Não parece ser o tempo a questão crucial, pois em face das inúmeras protelações o importante nessa altura é que a reforma seja finalmente feita.
O perigo mesmo é o de que a Câmara não tenha escolhido o caminho mais longo para chegar a um melhor resultado, mas para postergar ao infinito a solução do problema.
Tempo perdido. A aflição assola espíritos preocupados (todos dotados de bom senso e capacidade de fazer contas) com a infraestrutura necessária para a Copa do Mundo em 2014.
O atraso é visível a olho nu e escriturado em relatórios técnicos. Considerando que o Brasil foi escolhido como sede do campeonato em outubro 2007, há três anos e meio, há um atestado de inépcia a ser lavrado em nome do governo brasileiro, cujas prioridades eleitorais condicionam toda ação à obtenção de dividendos políticos de curto prazo.
Nesse período, o Planalto se ocupou da campanha presidencial de 2010 em detrimento de tudo o mais, tratando da Copa em 2014 e da Olimpíada de 2016 como fatos eleitoralmente rentáveis e nada mais.
As obras em si foram relegadas ao segundo plano, como se as celebrações tivessem por si o condão de fazerem acontecer condições objetivas necessárias à realização das duas maiores competições esportivas do mundo.
Lula faturou, mas o prejuízo - eventual vexame - será do País. Isso sem contar o custo propriamente dito que, devido à pressa, desnecessária caso o trabalho tivesse começado de imediato, será muito mais elevado: no tocante aos recursos despendidos e ao afrouxamento dos mecanismos de controle dos gastos públicos.
Incivil. Guardadas as proporções que distinguem o indispensável respeito à lei da necessária reverência aos bons costumes, Aécio Neves está para a recusa do teste do bafômetro como Lula esteve para o papel do bombom que certa feita desembrulhou e jogou no chão durante solenidade oficial.
Dois exemplos de desconsideração ao quesito "o exemplo vem de cima".


Reforma política sai das intenções

23/04/2011 - 07h00 - Congresso em Foco
“Parece que, desta vez, essa reforma sairá do papel, já que Câmara e Senado constituíram, separadamente, comissões para tratar do tema”

Sérgio Barradas Carneiro *

No Brasil sempre se discute, ano após ano, a necessidade de duas reformas, a tributária e a política. Parece que, desta vez, esta segunda sairá do papel, já que Câmara e Senado constituíram, separadamente, comissões para tratar do tema. Várias são as propostas. Como nenhuma delas tem consenso, serão disputadas no voto, em plenário. Para conhecimento do leitor sobre o que se passa no Congresso, faço aqui um resumo do que está sendo discutido.

As propostas deverão ser transformadas em projetos de lei ou emendas à Constituição, para que possam se tornar realidade. Eis algumas delas:

Lista fechada – Adoção de lista feita pelos partidos, em que o eleitor deixaria de votar no candidato para votar no partido. De baixa aceitação, esta proposta já foi votada duas vezes na Câmara dos Deputados e foi rejeitada.

Financiamento público – Esta proposta tem grandes possibilidades, uma vez que, apesar do desconhecimento da população, de certa forma ela já existe, por meio dos Fundos Partidários (dinheiro público transferido aos partidos). Bastaria ser aumentado o repasse nos anos eleitorais. Há grande possibilidade de ser proibida a contribuição de empresas. Particularmente, eu manteria a contribuição das pessoas físicas, abolindo o recibo de papel, coisa do século passado, considerando como bastante e suficiente para a prestação de contas do candidato à Justiça Eleitoral apenas o extrato bancário da conta de campanha, uma vez que esta já traz todas as informações necessárias do doador.

Candidatura avulsa – Com poucas chances de aprovação, pois fragiliza os partidos e dificulta sua operacionalização.

“Cotão” para as mulheres – Também com poucas chances, até porque estaria associada ao voto em lista fechada.

Fim da reeleição e mandato de cinco anos – Com boas chances de aprovação. Seria preciso resolver o tamanho dos mandatos de senadores, já que não poderiam permanecer oito anos sob pena de não coincidência de mandatos. A dúvida: o mandato seria aumentado para dez anos?

Fim das coligações partidárias – Este ponto é quase um consenso, pois até os pequenos partidos o apoiam. Posto em prática, segundo o Diap a partir dos resultados da eleição passada, teríamos seis partidos a menos. Tende a diminuir o número de partidos.

Fidelidade partidária – A ideia é manter a regra atual, onde o mandato pertence ao partido e a saída só pode ocorrer em casos como a criação de uma nova sigla ou fusão partidária.

Filiação partidária – Seria mantida a regra atual de filiação e domicílio há pelo menos um ano da eleição.

Data de posse – Outro consenso nas discussões. A posse do presidente da República seria no dia 15 de janeiro e dos prefeitos e governadores no dia 10 de janeiro, removendo as posses da data universal de 1° de janeiro.

Cláusula de barreiras – Já foi aprovada pelo Congresso em 1996 para entrada em vigência em 2006, mas foi considerada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Apesar da minha discordância, pois não impedia a criação de partidos, apenas estabelecia regras para o acesso ao Fundo Partidário e tempo de rádio e TV, o tema voltou à discussão. É difícil sua aprovação pela quantidade de pequenos partidos existentes hoje.

Suplente de senador – A proposta acaba com o segundo suplente, impede a indicação de cônjuge e parente consanguíneo até segundo grau. Em caso de vacância do cargo, o suplente assumiria até a próxima eleição, estadual ou municipal, quando então, seria preenchida novamente a vaga.

Voto obrigatório – Foi mantido. Sou a favor do voto facultativo.

Referendo – O sistema eleitoral escolhido seria submetido a um referendo.
Espero que os leitores (e eleitores) acompanhem as discussões e participem, enviando e-mails ou por meio das redes sociais, interagindo com os congressistas e, sobretudo com o parlamentar em quem votou nas últimas eleições.

*Advogado e administrador de empresas, está no terceiro mandato como deputado federal (PT-BA). Foi o procurador parlamentar da Câmara dos Deputados (biênio 2009/2010), chefe da Casa Civil do governo da Bahia (1986/1987) e deputado estadual (1991/1995). Autor da proposta de emenda constitucional (PEC 33/2007) que acabou com a separação judicial e instituiu o divórcio direto, aprovada e promulgada como emenda constitucional em julho de 2010. Publicou, entre outros, os livros Coletânea de artigos (2010) e Os efeitos do afeto elevados a valor jurídico (2006).




Política

O alvo comum

Merval Pereira, O Globo - 19/04/2011


O ex-presidente Lula deu ontem mais uma das inúmeras demonstrações que tem dado nos últimos anos de que não se preocupa em ser coerente nas suas opiniões desde que possa tirar algum proveito da palavra dita no momento político certo.
Nisso, no timing político, ele parece imbatível, desde que não se levem em consideração valores republicanos como seriedade no debate, nem nos incomode a prática de distorcer as palavras do adversário para ganhar a discussão no tapetão ideológico.
Depois de tentar ridicularizar a preocupação do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso com a nova classe média brasileira, transformando-a em abandono das classes populares, em reunião ontem com prefeitos do PT no estado de São Paulo o ex-presidente Lula defendeu que o partido busque alianças para as eleições municipais de 2012, incluindo nas suas chapas candidatos que atinjam setores da sociedade com os quais o PT tem dificuldades, como as classes médias e os empresários.
O exemplo de Lula foi seu ex-vice-presidente, José Alencar, a quem atribuiu importância capital na sua vitória de 2002 para a Presidência da República.
O diagnóstico de Lula está correto e corrobora a análise de Fernando Henrique. Os dois indicam o mesmo caminho para os partidos que lideram: a classe média ampliada deve decidir as próximas eleições municipais, especialmente diante de um quadro econômico adverso em que a inflação em alta e restrições de crédito podem afetar o sentimento de bem-estar que ela vem experimentando.

Na eleição municipal de 2004, o melhor ano em termos econômicos da administração Lula até aquele momento, isso não foi o suficiente. O governo perdeu as principais prefeituras do país, especialmente a de São Paulo, pois perdera o apoio da classe média de todo o país, atemorizada com o autoritarismo revelado por setores do governo e com o aparelhamento do Estado.

Além de todos esses problemas, há a questão da corrupção, que surgiu em meados de 2005 com o escândalo do mensalão.

De lá para cá, o desempenho sofrível do PT nas regiões Sul-Sudeste vem se mantendo inalterado, mostrando que ele continua a ter dificuldades na região mais rica e esclarecida do país.

Nada mais natural, portanto, que sua votação majoritária tenha migrado para o Nordeste.
O cientista político e ex-porta-voz de Lula André Singer, professor da USP, fez um trabalho acadêmico que se tornou imprescindível na análise do fenômeno do lulismo, em que o define como um grupo conservador, composto pelos beneficiários dos programas assistencialistas do governo e pelo aumento do salário mínimo.

Esse grupo identifica o governo como o fiador da estabilidade econômica e vê nele a garantia de sua nova situação financeira, que teme perder se houver alguma mudança inesperada.
Esse conservadorismo pode favorecer o governo, mas pode também afastá-los do governo se pressentir guinadas para a esquerda, por exemplo.

Essa análise do eleitorado brasileiro, e a necessidade de buscar uma conexão com esse grupo de cidadãos que hoje representa a maioria da população brasileira, é a mesma feita pelo ex-presidente Fernando Henrique, e fazer a ilação de que os tucanos são elitistas enquanto os petistas são os defensores do "povão" é apenas mais um embate político em que, por sinal, os petistas se saíram melhor até o momento porque os tucanos temem a imagem de elitistas.

Na análise petista, a nova classe média ainda está formando sua identidade sociocultural e por isso precisa ser acompanhada de perto. Entre 2003 e 2008, segundo dados do Centro de Pesquisas Sociais do Ibre, da Fundação Getulio Vargas do Rio, 31,9 milhões de pessoas ascenderam às classes ABC.

Essa "nova classe média", suas aspirações e, sobretudo, sua capacidade de ser um "agente fundamental" em uma revisão de valores da sociedade brasileira são analisadas pelos cientistas políticos Amaury de Souza e Bolívar Lamounier, no livro "A classe média brasileira: ambições, valores e projetos de sociedade", da editora Campus com o apoio da Confederação Nacional da Indústria (CNI), de que já tratei aqui na coluna. Vale a pena voltar a suas análises.

O fato de a mobilidade social dessas classes ter dependido amplamente do consumo, e não de novos padrões de organização ou desempenho na produção, demonstra a fragilidade dessa ascensão e justifica a incerteza que esses novos eleitores têm diante do quadro político.

Eles valorizam especialmente a educação, e os autores identificaram "um sentimento surpreendentemente generalizado" de insatisfação com a qualidade da educação.

A nova classe média, no entanto, considera a violência, a corrupção e as drogas como problemas mais graves que as carências referentes à saúde, ao desemprego, à habitação e à qualidade da educação.

Os cientistas políticos Amaury de Souza e Bolívar Lamounier constatam no livro que a classe média inclina-se pela democracia como a melhor forma de governo, "mas partilha com os demais segmentos da sociedade um sentimento de aversão à política".

Em grande parte, esse sentimento deriva da percepção de que a corrupção campeia no mundo da política, mas as pesquisas mostram que é também amplamente disseminada a sensação de que "os políticos e os partidos não se importam com a opinião dos eleitores".

É esse o eleitor do qual PT e PSDB estão atrás, assim como os partidos que disputam a centro-direita política, como o DEM e o futuro PSD.

Fonte: O Globo
Fale com o autor: merval@globo.com.br



Elio Gaspari: PT planeja golpe regimental

Reforma política travada pela falta de 308 votos poderá ser aprovada por apenas 129 deputados

3 de abril de 2011

O Comissiariado Petista planeja um golpe regimental para impor ao país um sistema eleitoral pelo qual os cidadãos perderão o direito de votar nominalmente em seus candidatos para a Câmara.

Com o apoio do DEM, o PT conseguiu que a comissão do Senado encarregada de estudar a reforma política recomendasse a instituição do voto de lista. Nele, as direções partidárias enumeram seus candidatos, deixando à patuleia apenas o direito de escolher uma sigla.

O resultado dessa votação quer dizer pouca coisa. O golpe está noutro lugar, escondido.

Imagine-se a seguinte situação: chega-se ao mês de setembro e os plenários da Câmara e do Senado apreciarão as propostas de emendas constitucionais necessárias para que se aprove a reforma.

Uma quer o distritão, outra, o distrital puro e uma terceira sugere um sistema misto. Para ser aprovada, qualquer emenda precisa de três quintos dos votos de cada Casa. Ou seja, o apoio de 308 dos 513 deputados e de 49 dos 81 senadores. Cada emenda vai a voto e nenhuma consegue passar.

Nessa hora aparece um sábio pedindo que se passe à votação dos projetos de lei existentes na Casa. Há um, instituindo o voto de lista. Já foi rebarbado duas vezes, mas não custa apreciá-lo de novo. Como se trata de lei ordinária, não demanda três quintos. Basta a maioria simples. No caso da Câmara, uma reforma política travada pela falta de 308 votos poderá ser aprovada por apenas 129 deputados, numa sessão de frequência mínima. Admitindo-se que o plenário esteja lotado, a mudança passa se tiver 257 votos. Os defensores da lista querem criar a figura do deputado sem eleitor. Tudo bem, mas devem se submeter aos três quintos exigidos pela Constituição. Senão, trata-se de uma tunga regimental para alavancar outra, cassando o direito dos brasileiros de escolher seus deputados pelo voto nominal e direto.

Com informações da Folha.